Escola Bilíngüe

“É uma escola unique

Diana Mandelert
Diana Cerdeira

Apresentação

       O texto que se segue pretende descrever a escola bilíngüe com base nas informações obtidas na página da escola na Internet, complementadas por observações de campo e conversas com coordenadores. Buscou-se traçar um retrato sintético dos alunos, pais e professores da 8ª série do ensino fundamental com base nas respostas obtidas através dos questionários do SOCED aplicados em 2004. Cabe assinalar que foram estabelecidas algumas comparações com os percentuais obtidos na média das demais escolas investigadas, que se encontram registrados entre parênteses em cada referência.

        O objetivo do presente texto é apresentar o conjunto atualmente disponível de informações sobre a escola a fim de que possa servir como pano de fundo da análise a ser desenvolvida a partir da pesquisa de campo, iniciada em 2006, que deverá focalizar o clima escolar e os fatores que contribuem para a construção da qualidade do ensino.

A escola

        Foi fundada em 1924 e inicialmente era uma escola basicamente para estrangeiros. Funcionou entre 1945 e 1949 clandestinamente por ocasião da proibição de escolas estrangeiras no país decretado no governo de Getúlio Vargas. Em 1975 foi aberto um curso especial para ensinar aos alunos brasileiros a língua estrangeira como segunda língua. Em 1989 a escola unificou os dois cursos e adotou o calendário brasileiro para o ano letivo (março a dezembro). Atualmente 82% dos alunos são brasileiros e o restante é proveniente de vários países, a maioria da Europa. Atualmente, escola possui três sedes, duas na zona sul e a outra na zona oeste.

        A entrada dos alunos é a partir dos 3 anos para que o aprendizado do idioma estrangeiro aconteça de forma mais eficaz. Para entrar na escola depois dessa idade é necessário realizar uma prova de língua e de matemática.

        A escola define, na página na internet, como sua missão o desenvolvimento de indivíduos responsáveis, bem informados, de mente aberta, confiantes e humanitários. Para isso, é oferecida uma comunidade educacional na qual todos os alunos são estimulados a realizar todo o seu potencial pelo desafio de uma formação baseada em uma educação da cultura do país de origem da escola, não discriminatória a um ambiente bi-cultural.

        É oferecido um currículo que posteriormente capacita os alunos a realizarem provas para obtenção de certificados que permitem a entrada em universidades estrangeiras.

        No endereço eletrônico é informada a mensalidade média da escola, no valor de R$2.276,50. Existe ainda uma taxa no momento da entrada do aluno na escola chamada de “fundo para o desenvolvimento da escola” que custa RS$14.000,00 para o primeiro filho, R$9.000,00 para o segundo filho e R$7.000,00 para os demais filhos.

Dados do Survey:

As famílias dos alunos da 8ª série no questionário do SOCED

        As informações ora apresentadas referem-se ao conjunto de 26 famílias de alunos (37%) que devolveram os questionários preenchidos1. Os pais da escola bilíngüe são na sua maioria casados (69%), sendo que 76% assinalaram não ter tido nenhuma união anterior. Usando os dados do questionário dos alunos2 , podemos observar que 44% das famílias são compostas de dois filhos e 41% de dois ou mais filhos. Com relação à escolarização, apenas um pai assinalou ter concluído somente o ensino médio e 46% fizeram mestrado ou doutorado. Todas as mães completaram pelo menos o ensino superior, sendo que 24% fizeram mestrado ou doutorado. O conhecimento em línguas estrangeiras é bem maior do que nas demais escolas: 73% de pais e mães assinalaram ter um bom conhecimento de inglês, nas demais escolas a porcentagem maior será a da escola judaica com 57% para os pais em conhecimento de inglês e 64% para as mães.

        Com relação aos gastos escolares, 52% assinalou gastar mais de 20% do seu orçamento na escolarização dos filhos, 58% indica que a escola impõe sacrifícios e 23% apontaram receber algum tipo de bolsa de estudos.

        As viagens internacionais são indicadoras de capital econômico, cultural, social e profissional dos pais. A escola bilíngüe apresenta os percentuais mais altos de viagens internacionais nos últimos três anos, tanto no questionário dos pais quanto dos filhos com mais de 80%. As outras escolas apresentaram percentuais um pouco acima ou abaixo de 50%.

Os alunos da 8ª série no questionário do SOCED

        Os questionários do SOCED foram respondidos pela totalidade dos 71 alunos da 8ª série em 2004. A faixa etária dos alunos de 15 anos é de 72%, faixa mais concentrada que das outras escolas que têm em média 46% nesta faixa. Dos alunos da 8ª série, 70% assinalaram que nunca estudaram em outra escola. Já nas outras escolas este percentual cai para 54%. Na escola bilíngüe praticamente todos os alunos nunca repetiram de ano (99%), apenas um aluno declarou já ter repetido uma vez em outra escola. A professora de português no nosso primeiro dia de observação afirmou que são muito raros os casos de repetência na escola.

        Os itens que revelam a disciplina dos alunos em sala de aula nos mostram que, em relação às demais escolas, os alunos da escola bilíngüe são mais disciplinados, pois, a maioria acredita que os professores não precisam esperar muito por silêncio para iniciar a aula e que o barulho e a desordem em sala só acontece em poucas aulas. Vale ressaltar que na página da escola é informado que as turmas têm de 8 a 24 alunos, sendo que a proporção de professores por aluno na escola é de 1:10. Isto provavelmente explica a porcentagem de 97% dos alunos da escola bilíngüe que assinalaram que os professores são disponíveis para esclarecimento de dúvidas. A porcentagem de alunos da escola bilíngüe que assinalam que os professores dão liberdade para que possam expressar suas opiniões em aula (90%) também será bem maior do que nas outras escolas.

        Os deveres de casa são feitos sem atraso para 75% dos alunos, enquanto nas demais escolas este número cai para 61%. Esta diferença talvez possa ser explicada por outra resposta dos alunos da escola bilíngüe, quando 89% assinalaram fazer o dever porque vale nota, já nas outras escolas os percentuais são menores. Os alunos da escola bilíngüe são os que mais indicaram estudar “algumas vezes” ou “quase sempre” nos fins de semana com 90% dos alunos, já nas outras escolas o percentual será de 76%.

        Os dados parecem indicar que os alunos da escola bilíngüe sentem menos necessidade de reforço com aulas particulares (75% não tiveram professor particular). Existe a hipótese deste fato ocorrer devido à maior disponibilidade dos professores desta escola, além do horário integral. Nas demais escolas, mais da metade dos alunos já teve professor particular (54%). Por outro lado, dos alunos da escola bilíngüe que afirmaram ter tido professor particular, 30% precisou o ano inteiro, enquanto que dentre os alunos das demais escolas que tiveram professor particular, apenas 18% precisou durante todo o ano letivo. Um outro dado interessante é que, assim como na escola pública, na escola bilíngüe, são os pais dos alunos que sentem que seus filhos precisam de um reforço (respectivamente:93% e 88%), ao passo que nas outras escolas são os próprios alunos que mais sentem esta necessidade (68%).

        Todos os alunos da escola são fluentes no inglês, além de terem maior domínio no espanhol do que os alunos das demais escolas: 84% declarou ser “bom” e “razoável” na língua espanhola, em comparação com 28% dos alunos das outras escolas. No que diz respeito ao francês, o desempenho é muita parecido para todas as escolas.

        Com relação aos hábitos de leitura, todos os alunos da escola bilíngüe lêem livros de ficção. Estes alunos lêem mais poesia e menos revistas informativas que os alunos das demais escolas. Os alunos das outras escolas consideram mais a leitura como diversão do que os alunos da bilíngüe. Em relação aos hábitos culturais e de lazer, fica claro que os alunos da bilíngüe freqüentam mais museus e centros culturais (68% X 56%), até mesmo porque a escola oferece mais passeios que as demais escolas (67% X 35%). Além disso, quase todos os alunos da bilíngüe já viajaram para o exterior (96%), enquanto que nas demais escolas, apenas 37% dos alunos já viajaram.

Os professores da 8ª série no questionário do SOCED

        A escola tem um corpo docente de 5ª a 8ª série e ensino médio composto por 33 professores, dos quais 22 lecionam na 8ª série. Apenas 7 ou 32% dos professores responderam ao nosso questionário. Como o retorno foi mais baixo do que o esperado, cogitamos a possibilidade disto ocorrer devido ao fato dos questionários serem em português e a maioria dos professores serem estrangeiros. Além disso, a entrega e a devolução dos questionários foi organizada pela direção da escola, o que talvez tenha causado algum tipo de constrangimento por parte dos professores em retornar o questionário na hipótese da falta de sigilo. De acordo com as respostas ao questionário, nenhum professor da escola bilíngüe é recém-formado (até 5 anos), pelo contrário, 71% afirmam serem formados há mais de 25 anos. Nas demais escolas 13% são recém-formados. A maioria dos professores das outras escolas afirmou ser formada por uma instituição pública federal (56%), enquanto que na bilíngüe este percentual é equilibrado entre instituições públicas federais, estaduais e privadas confessionais (27% para cada).

        Os professores das outras escolas se consideram mais da elite (67%) do que os professores da escola bilíngüe (43%). Acreditamos que esta representação se deva ao contexto que eles estão inseridos, ou seja, como as famílias desta escola possuem um nível socioeconômico muito alto, comparativamente os professores estão mais abaixo. Corroborando nossa hipótese, vemos que na opinião de 100% dos professores da escola bilíngüe a clientela da escola (lembramos que nos referimos à 8ª série), ou seja, os alunos e suas famílias, são da elite econômica. Nas outras escolas apenas 60% compartilham da mesma opinião. Em contrapartida, 59% dos professores das outras escolas crêem que sua clientela vem de uma elite acadêmica. Este percentual cai na opinião dos professores da escola bilíngüe para 43%.

        Os professores da escola bilíngüe utilizam mais livros de literatura que os professores das demais escolas (86% X 51%), bem como revistas de divulgação científica (71% X 51%). Também utilizam mais recursos tecnológicos, como retroprojetor (71% X 54%); computadores (100% X 61%); e internet (71% X 55%). Por fim, viajam mais com seus alunos, do que os professores das demais escolas (71% X 18%).

        Assim como os alunos, os professores da escola bilíngüe além de dominarem 100% a língua inglesa, dominam também um pouco mais o espanhol. O domínio da língua francesa se mantem parecido entre a escola bilíngüe e as demais escolas.

        Encontramos também muitas diferenças em relação ao salário dos professores: na escola bilíngüe, nenhum professor ganha menos de R$2800,00 (nas demais escolas, 30% ganha até essa faixa) e 86% ganham mais de R$3.600,00 (X 52% dos professores das demais escolas). No que diz respeito à renda familiar bruta dos professores, enquanto nas outras escolas 56% somam menos de R$6000,00 mensais, todos os docentes da escola bilíngüe somam mais do que esse valor. 43% dos professores da escola bilíngüe (X 23%) somam mais de R$8.000,00 mensais.

        Como a porcentagem dos professores que responderam ao questionário foi muito baixa, pedimos as coordenações dados específicos de todos os professores do segundo segmento do ensino fundamental até o ensino médio. Esses dados revelam que 82% dos professores são mulheres. A idade de 61% dos professores é de mais de 40 anos, sendo que 27% têm entre 30 e 39 anos. O tempo de trabalho na escola divide-se em faixas bastante homogêneas: 30% têm até 5 anos, 36% entre 6 e 15 anos, 34% mais de 16 anos. Vale destacar que o contrato de trabalho de professores estrangeiros (que segundo a coordenadora da escola são a maioria) é de, normalmente, dois anos.

        A titulação dos professores é em 67% dos casos de nível superior, sendo que 24% já fizeram mestrado. Esta porcentagem é mais baixa do que nas escolas públicas federais. A dedicação de 85% dos professores é integral.

        Esta é uma descrição e uma análise preliminar do perfil da escola bilíngüe. Esperamos futuramente, enriquecer esta análise, tendo em vista que, ao longo de 2006, pretendemos entrar na 2ª etapa da pesquisa, dando continuidade ao trabalho de campo. Serão desenvolvidas observações nos diversos ambientes e atividades escolares, bem como, entrevistas, procurando investigar o clima escolar e os fatores que contribuem para a construção da qualidade do ensino.




1Cabe observar aqui, que a solicitação de preenchimento foi feita por carta e pelo envio do material através dos próprios alunos, não tendo havido contato direto com os pais nesse processo.

2Aos alunos foi questionado quantos irmãos tinham. Portanto, temos a informação de todos os alunos da 8ª série.